para a sua mulher, mandou que
descesse a bainha dos vestidos
e parasse de se pintar.
Apesar disso, sua beleza chamava
a atenção, e ele foi obrigado a exigir
que eliminasse os decotes,
jogasse fora os sapatos
de saltos altos.
Dos armários tirou as roupas de seda,
da gaveta tirou todas as jóias.
E vendo que, ainda assim, um ou
outro olhar viril se acendia
à passagem dela, pegou a tesoura
e tosquiou-lhe os longos cabelos.
Agora podia viver descansado.
Ninguém a olhava duas vezes,
homem nenhum se interessava
por ela. Esquiva como um gato,
não mais atravessava praças.
E evitava sair.
Tão esquiva se fez, que ele foi
deixando de ocupar-se dela,
permitindo que fluísse em silêncio
pelos cômodos, mimetizada com
os móveis e as sombras.
Uma fina saudade, porém,
começou a alinhavar-se
em seus dias.
Não saudade da mulher.
Mas do desejo inflamado
que tivera por ela.
Então lhe trouxe um batom.
No outro dia um corte de seda.
À noite tirou do bolso uma rosa
de cetim para enfeitar-lhe o que
restava dos cabelos.
Mas ela tinha desaprendido
a gostar dessas coisas, nem pensava
mais em lhe agradar. Largou o tecido
em uma gaveta, esqueceu o batom.
E continuou andando pela casa
de vestido de chita,
enquanto a rosa desbotava
sobre a cômoda.
MARINA COLASANTI,
in CONTOS DE AMOR RASGADOS
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