9.11.21

ISABEL FRAGA, in MÚSICA DAS ESPERAS,

 


A dor dos outros

Está fora da janela.

Entristece-nos

Como um ciclo de chuvas

Mas não nos molha os pés

Nem os cabelos.


Por vezes avistamo-la

Na soturna rua

Que a medo atravessamos.

Ou no café

Onde uma mão se estende.


Vamos então ao armário maior

Buscar o dó, a pena.

E ao porta-moedas

Rebuscar uns trocos.


Alguns de nós

Mas poucos, muito poucos,

Guardaram bagas

Que o tempo lhes ditou.

Verdades que hibernaram

No gelo das idades

E germinaram em caverna escura.


Só esses têm a coragem de ver

Que a dor dos outros

É sempre a nossa dor

Que anda em viagem.

E que, curvada,

Ao peso da bagagem

Nos persegue

E procura.


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