26.11.21

VALSINHA



 Um dia ele chegou tão diferente 

do seu jeito de sempre chegar

Olhou-a de um jeito 

muito mais quente 

do que sempre costumava 

olhar

E não maldisse a vida tanto 

quanto era seu jeito 

de sempre falar

E nem deixou-a só num canto, 

pra seu grande espanto, 

convidou-a pra rodar


E então ela se fez bonita 

como há muito tempo 

não queria ousar

Com seu vestido decotado 

cheirando a guardado 

de tanto esperar

Depois os dois deram-se os braços 

como há muito tempo 

não se usava dar

E cheios de ternura e graça, 

foram para a praça 

e começaram a se abraçar


E ali dançaram tanta dança 

que a vizinhança 

toda despertou

E foi tanta felicidade 

que toda cidade se iluminou

E foram tantos beijos loucos, 

tantos gritos roucos 

como não se ouvia mais

Que o mundo compreendeu, 

e o dia amanheceu em paz.


VINICIUS DE MORAES – Poema; CHICO BUARQUE – Melodia e voz, 1970)


18.11.21



 "Que estejamos presentes 

em memórias alheias. 

Que alguém já distante lembre 

do nosso sorriso e se sinta acolhido. 

Que o nosso bem faça bem ao outro. 

Que sejamos a saudade batendo 

no peito de uma velha amizade. 

Que sejamos o amor que alguém 

nunca esqueceu. 

Que sejamos um alguém 

que sorriu na rua 

e o desconhecido encantou-se. 

Que sejamos, hoje e sempre, 

uma coisa boa que mora 

dentro de cada um 

que passou por nós."


 Camila Costa


13.11.21



 

😍



 

Katie Melua




 

Manuel António Pina.

 

‘A Canção dos Adultos’, in 𝘛𝘰𝘥𝘢𝘴 

𝘢𝘴 𝘗𝘢𝘭𝘢𝘷𝘳𝘢𝘴 



Parece que crescemos 
mas não.
Somos sempre do mesmo 
tamanho.
as coisas que à volta estão
é que mudam de tamanho.
Parece que crescemos 
mas não crescemos.
são as coisas grandes 
que há,
o amor que há, a alegria 
que há,
que estão a ficar mais 
pequenos.
Ficam de nós tão 
distantes,
que às vezes já mal 
os vemos.
por isso parece que 
crescemos
e que somos maiores 
que dantes,
mas somos sempre 
como dantes
talvez até mais pequenos.
Quando o amor e o resto 
estão tão distantes
que nem vemos como

 

estão distantes.
então julgamos que 
somos grandes
e já nem isso 
compreendemos.

9.11.21

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN




Devagar no jardim a noite poisa

E o bailado dos seus passos

Liberta a minha alma dos seus laços,

Como se de novo fosse criada cada coisa.

ISABEL FRAGA, in MÚSICA DAS ESPERAS,

 


A dor dos outros

Está fora da janela.

Entristece-nos

Como um ciclo de chuvas

Mas não nos molha os pés

Nem os cabelos.


Por vezes avistamo-la

Na soturna rua

Que a medo atravessamos.

Ou no café

Onde uma mão se estende.


Vamos então ao armário maior

Buscar o dó, a pena.

E ao porta-moedas

Rebuscar uns trocos.


Alguns de nós

Mas poucos, muito poucos,

Guardaram bagas

Que o tempo lhes ditou.

Verdades que hibernaram

No gelo das idades

E germinaram em caverna escura.


Só esses têm a coragem de ver

Que a dor dos outros

É sempre a nossa dor

Que anda em viagem.

E que, curvada,

Ao peso da bagagem

Nos persegue

E procura.




 



 

3.11.21

ESTRANHO FULGOR

 


Deu-me Deus bodas vermelhas

E palavras como abelhas

Esquecendo-se de mim.


Deu-me a paz de alguns minutos

E palavras como frutos

Esquecendo-se de mim.


Deu-me as ideias formosas

E palavras como rosas

Esquecendo-se de mim.


Deu-me a voz que persuade

Muito mais do que a verdade

Esquecendo-se de mim.


Mas um dia, veio a dor

Veio o castigo sem fim

Veio este estranho fulgor

Apartando o bem do mal

E vi que Deus afinal

Já se lembrava de mim...


PEDRO HOMEM DE MELLO

AMIGO

 


Porque vejo nos teus olhos

sem os ver

Porque sinto a tua presença

sem a ter

Porque me escutas

sem me ouvires

Porque me afagas

sem me tocares

Porque me olhas

sem me ver

Porque derrotas

a minha solidão

Porque me iluminas

quando há escuridão

Porque és

Verdade 

Luz

Espelho

Água

Vida

Sorriso

Ponte

Mar

Casa

Porque és

partilha

És

meu amigo.


FÁTIMA GUIMARÃES 

Tagua Tagua

 Voa num mergulho fundo E nada demais Segue livre pelo mundo Que o mundo vai atrás Samba no caminho torto E não cai jamais Se te fisguei, te...