Você é o seu sexo.
Todo o seu corpo é um órgão sexual,
com exceção talvez das clavículas.
(Como é frágil o coração humano —
E logo eu
Que nunca fui de observar
As voltas que o mundo dá
E de repente eu reparei
Na cor do seu vestido
Porque a nossa época é
essencialmente trágica,
recusamos encará-la tragicamente.
O cataclismo deu-se, estamos entre ruínas, começamos a construir novos pequenos mundos,
a ter novas pequenas esperanças.
É um trabalho bastante difícil:
deixou de haver um caminho ameno para o futuro, mas contornamos ou galgamos os obstáculos.
Temos de viver, por mais que os céus tenham desabado sobre nós.
Lobos? São muitos.
Mas tu podes ainda
A palavra na língua
Aquietá-los.
Mortos? O mundo.
Mas podes acordá-lo
Sortilégio de vida
Na palavra escrita.
Lúcidos? São poucos.
Mas se farão milhares
Se à lucidez dos poucos
Te juntares.
Raros? Teus preclaros amigos.
E tu mesmo, raro.
Se nas coisas que digo
Acreditares.
A Paixão da Sua Vida
Amava a morte
Mas não era correspondido
Tomou veneno
Atirou-se de pontes
Aspirou gás
Ela sempre ela o rejeitava
Recusando-lhe o abraço
Quando finalmente desistiu da paixão
Entregando-se à vida
A morte, enciumada
Estourou-lhe o peito
(Marina Colasanti)